
Os meus jardins são estéreis porque não são verdadeiros, mas a beleza que têm ultrapassa a de qualquer bosque no mundo. O meu rosto é jovem, mas imperecível e tão antigo quanto a idade dos Homens… Entre o baixo e o alto fui amado dos deuses e na terra sou fonte de cultos onde os que amam a Beleza me visitam e bebem. O que busco e instigo é o prazer, e o prazer maior encontrei-o em mim mesmo. Narciso é o meu melhor amigo. Alturas há em que sonho ser ele um pedaço do meu eu. Na verdade, sofremos vias diferentes, mas na essência somos um só e Ovídio deu-nos vida no mesmo poema. Dorian Gray fundiu-se comigo e o retrato dele é o meu. Dele nasceu a minha consciência que aguarda ainda o herói que a contemple. Eu sou múltiplo, concebido de opostos; sou a Treva e a Luz, o Dia e a Noite; mas nada há em mim que não seduza: como este bosque onde vivo e onde tudo convida à contemplação. Toma guarda, porém, incauto espectador! Advertiu-me um oráculo sobre o poder do olhar: Voir est un acte; l'oeil voit come la main prend (Paul Nougé); e agir, por sua vez, é mudar e ser mudado. Cuida pois nos gestos, no olhar! Toma guarda das metamorfoses! Cuidado viajante!, cuidado!
(Lausanne, 15/02/04)
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