Alexandria - Se Tu Queres Sarar a Solidão...

Do Elogio da Morte ao Requiem do Abandono, Alexandria é a Biblioteca das Ruínas de cada Eu fragmentado, da insustentável esquizofrenia do Mundo...

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Tuesday, May 29, 2007

Da Patologia ao Saber - De Zero a 1000

A necessidade aguça o engenho. É a estranheza que apela à procura. É a doença que move a evolução; sem o unheimliche o desafio perde-se e o homem estagna como um paúl esquecido num campo por onde já ninguém passe e tudo esteja seco e infértil e malsão. Os grandes psicólogos do século dezanove, que ainda não eram psicólogos, concentraram na estranheza o conhecimento de si. Como se um bicho exterior estivesse no interior e o bicho exterior que somos não o reconhecesse. Num homem vivem dois monstros que se estranham e esperam por ser apresentados. A guerra dá-se por o organismo ser simplesmente o organismo, sem regras de civilização e etiqueta. E é assim que está bem. Não se queira mais do que o que se pode ter. Isto é: Queira-se tudo. Seja-se doente por inteiro, alienígena de si mesmo e do mundo, estranho numa terra estranha como se Marte fosse isto que somos e onde estamos e não houvesse ninguém, não pessoas, mas coisas com vida, coisas que mexessem como objectos pensantes movidos a artes mágicas. O meu braço a separar-se-me do corpo e a dançar nos salões do vice-rei! Ah, Sá-Carneiro, ah, modernista!, Ah descobertas na invenção de mim! Adoentei-me por querer ir para além de tudo. Se a vida é uma miséria, para quê chorá-la? Se o irremediável é já o irremediável, para quê querer remediá-lo? Se é a degradação que me toca, se é ela que importa em tudo, para quê querer negar a importância que tem? Há desgraça no mundo e ela, por destino, pertence-me? Matar-me com três tiros de pistola num banco de jardim? Com veneno num quarto de hotel estrangeiro à espera que o meu pai me pague o funeral? Ir de burro ajaezado à andaluza subir ao raio de Júpiter, ao martelo de Thor ou descer ao Hades? Ser furioso incontrolado das sensações profundas? Para quê? O suicídio é a cura de todos os males... Que cura? O suicídio é o sofismo ontológico. A falácia das potencialidades de ser. O erro de cálculo matemático em que, por batota, por fraude, por comezinha mesquinhez, o contabilista quotidiano se chega à Inspecção Tributária da Biologia Viva que sou eu e declara: Se eu apagar estes zeros, e estes números demasiadamente redondos, se eu puser aqui mais um traço como quem veste um casaco num dia frio, quem vai notar? Quem vai dizer que existiu um problema? Tudo é perfeito. Tudo é harmonia. Nada sonda o mistério: o problema é a própria solução... Simplificar é evoluir. Está desfeito o Enigma. Estou aqui e respiro. Está feita a prova. Faltou-me, criei. Está curada a doença. Da patologia evoluí para o saber. Do Zero que era fiz-me Tudo.
(Lisboa, 05/06/96)

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