Alexandria - Se Tu Queres Sarar a Solidão...

Do Elogio da Morte ao Requiem do Abandono, Alexandria é a Biblioteca das Ruínas de cada Eu fragmentado, da insustentável esquizofrenia do Mundo...

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Imagine Alexander, before conquering half the world: A man full of dreams and handful of sand. Well, that's me...

Sunday, July 08, 2007

Sonata Contra a Tristeza

Sim, bem sei que tudo é triste; esta é daquelas noites em que o manto azul do firmamento perde as suas estrelas; ouvi dizer até que um vento se aproxima, capaz de arrancar as raízes das árvores e o telhado das casas, e o coração dos homens mais sensíveis; ouvi dizer que o Hades subiu à superfície e vem julgar os mortais e arrancar-lhes a pele, e exigir-lhes a expiação das faltas; ouvi dizer que a Solidão, essa Raínha gélida e cruel, fez estalar os chicotes sobre os seus corcéis congelados e rodou sobre os astros, desde os pólos, até ao teu peito cansado onde agora repousa; ouvi dizer que um monstro do Sem-Fim subiu à tua cama, se encostou a ti, e te soprou ao ouvido as maldições dos mortos e as rezas negras das Trevas, condenando-te ao Eterno Desespero; ouvi dizer que o Tirano do Destino te apontou um ceptro de mármore comprido e te fez ameaças:Nada receies. Estarei sempre por perto quando precisares, quando a Sombra vier importunar-te. Anda, não cismes! Sai da beira do abismo! De que te serve olhá-lo como quem olha um poço, cravando os olhos no fundo para ver quando acaba? Há um céu lá em cima! Que fazes tu, então, nesse inclinar para baixo? O fundo só podes vê-lo se lá levares todo o corpo. Julgas tu que é a hora de visitar as ruínas de um Palácio sem fundo, se até o seu Rei o abandonou?! Então? O que é isso que choras? Um fumo que passou. Un détail. Un fait-divers… Tudo evolui. Guarda do antes a memória que restar e arrepia caminho. O amor é uma fatia da vida, um jogo de crianças em que entras, brincas e descansas para todo o sempre. Diverte-te enquanto jogas e ele passa depressa. Vais ver que, quando os dados deixarem de rodar, e as cartas já não baterem sobre o lenho antigo dessa mesa de pinho, e os tabuleiros de damas e xadrez se virarem para baixo e se arrumem as peças, vais pedir (como um menino que peça um caramelo) para jogar outra vez… São assim as coisas… No fundo, penso eu às vezes, é como ouvires ou compores uma canção cujas notas, a princípio, andem fora de tom; e cabe-te a ti afina-las e ser o mestre de orquestra. De que te serve queixares-te de que não percebes de música? É tão difícil, no fundo, quanto apertar os sapatos! No início não sabes como aquilo se faz, é um movimento difícil, é preciso tomar-lhe o jeito, treinar o laço, compreender a elegante ciência de prender aos pés os confortáveis devoradores de caminhos… Depois aprendes a fazê-lo sozinha e, um dia, dás por ti, e atares os sapatos com um gesto elegante de bailarina russa é uma coisa natural do teu corpo, que fazes sem custo enquanto vês televisão, entras numas conversa, cantas uma música… Já nem precisas de te concentrar, fá-lo de olhos fechados… E então, que ideia poética! Nenhum ente superior ou inferior a ti, nenhum misticismo sobrenatural, nenhuma metafísica, nem uma nesga de deus, pode ensombrar os teus passos, e apenas tu te apresentas ao mundo sensível, maestrina das sensações de ti mesma e do mundo imenso em redor, agitando a tua batuta omnipotente, dirigindo cada acontecimento isolado do teu próprio universo… Não é sublime este pensamento?
«Ah, é impossível!», deves estar a queixar-te; mas o que é impossível? Apenas o que a tua vontade não consente. E quem manda na tua vontade? É, pois, este o meu lema para a vida: Quer, e sê feliz…

(Lisboa, 20/12/99)

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