Alexandria - Se Tu Queres Sarar a Solidão...

Do Elogio da Morte ao Requiem do Abandono, Alexandria é a Biblioteca das Ruínas de cada Eu fragmentado, da insustentável esquizofrenia do Mundo...

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Imagine Alexander, before conquering half the world: A man full of dreams and handful of sand. Well, that's me...

Friday, June 22, 2007

Diário do Conservador de Bobines: Homenagem a Oscar Fingall O’ Flaherty Wills Wilde:

Fui à tela ver a vida de Oscar Wilde…Ah, meu doce irlandês insuportável! Meu amor ideal sem efectividade alguma! Minha fraqueza animal! Bem dito, nem fui ver-te... Eu mesmo fiz rodar o teu filme numa sala de cinema antigo; pouca gente foi ver... as cadeiras vazias e eu de alma cheia a admirar-te... Porfim tudo acaba, e a magia das coisas excepcionais teima, por força, em querer desaparecer... Mas eu estava possesso, extasiado, doido! Fui a correr pelas ruas a gritar o teu nome! Já em casa, na minha cave húmida e sombria, deitei-me sobre o colchão de molas que rangem e guincham como velhas loucas e olhei os livros da minha biblioteca... Imaginei então o excepcional que seria que tu saísses deles por artes do oculto e te sentasses sobre o bordo da minha cama a ranger, e que os dois nos deixássemos por horas a falar sobre tudo e sobre nada... Os nossos gostos, as nossas ideias, as ideias dos outros, mesquinhos e banais... pensar como um modo de falar, falar como um modo de pensar... depois um brandy, um absinto, uma tertúlia... eu leria as tuas peças de teatro de ironias finas e mordazes, e tu os meus poemas de bolso em edição privada de autor anónimo e menor... Ah, meu Wilde! não o sabes, não o imaginas sequer, nem isso que não sabes e que não imaginas te interessa (muito menos agora que estás morto), mas partilhamos as fúrias e os medos... As campas, é sabido, não devolvem os corpos do deserto onde descansam, como Plutão não devolve as suas presas... Por isso, tu não podes ouvir-me e eu falo para um papel que nada tem para me dar; e falar assim para um papel, e dá-lo a ler a outros é ridículo e inútil; mas o que há de mais belo e de mais significativo no mundo é, normalmente, ridículo e inútil. Porque esse é o espelho da nossa natureza… Assim, ridícula e inutilmente te confesso a minha inclassificável admiração por ti, a coragem com que sempre enfrentáste os brutos da tua altura. Todas as eras têm brutos. O génio é aquele que, com grandeza, se destaca dos seus... E se tu, meu adorado, tinhas génio! E se tu tinhas carácter! Em nada te eram melhores e tu, homem faltoso e soberbo, eras melhor em tudo! Que tinham eles, os dandys, os patetas, que não tivesses tu?! Eu digo-to, que o sei! - A podridão da alma! A tua eloquência sublime é ainda hoje imortal e prevalece, mesmo estando tu morto, na oralidade e na escrita. A tua elegância, o teu paradoxo profundo, a beleza poética de tudo o que escrevias são Hinos à inexistente alma Humana. Sim, Oscar, talvez (eu sonho ainda, enquanto, depois do teu filme naquela frágil tela, projecto a minha vida além de mim), talvez o teu fantasma pudesse surgir-me um dia para discutirmos a natureza do Tempo; pois tu entenderias, melhor do que ninguém, que, entre dois seres inteligentes, isso é afinal tão arbitrário e tão poético, no jogo infindável da linguagem, quanto o, por exemplo, falar-se de amor… E então, quem sabe, também tu me terias admirado, e também tu virias, ridícula e inutilmente, escrever um qualquer texto num cadarnado esfolado, que louvasse com saudade amargurada o filme singular da minha vida…
(Lisboa, 28/11/99)

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